Rédeas
Foram apenas oito dias entre a noite que a Câmara dos Deputados aprovou com pompa e circunstância a PEC da Blindagem, com apoio da ampla maioria, e a tarde histórica e emblemática de ontem em que a CCJ do Senado enterrou a proposta. Os 26 senadores que compõem o colegiado votaram contra a matéria, até mesmo quem antes a defendia.
Última palavra
A sombra da PEC pode até voltar a rondar em algum momento, mas não nessa legislatura. A negativa veemente e contundente dos senadores e, ratificada em plenário pelo presidente da casa, o senador Davi Alcolumbre (União-AP), ao embasar com o regimento interno o arquivamento da proposta, deu o recado que o assunto – por ora – está sepultado.
Exposição
Os deputados, a ampla maioria que votou pela blindagem na semana passada, se sentiram “traídos”, lesados e expostos pelo Senado Federal. Como a casa passa de aliada a contestadora num rápido intervalo de tempo? Faltou combinar alguma coisa? Não. Os senadores não quiseram pagar a fatura da Câmara e cair, ainda mais, em descrédito com a população. Os últimos movimentos do Senado revelam maturidade política que está faltando na Câmara, envolta com o excesso de questões pequenas e internas.
Recibo
Para entornar mais ainda o caldo e expor o fisiologismo da Câmara, o Senado também avançou, ontem, um projeto é uma aposta muito cara para o Planalto: o aumento da isenção da alíquota do imposto de renda para aquele trabalhador que ganha até R$ 5 mil, que representa uma grande parcela da população brasileira. A proposta aprovada em caráter terminativo na CAE é de autoria do senador Eduardo Braga (MDB-AM) e tramitava na casa há 6 anos. Ela é bastante similar ao PL 1087/25, do governo, e que aguarda votação na Câmara dos Deputados.
Manobra
O governo vem negociando a semanas com a Câmara a votação do projeto que vai ampliar a isenção da cobrança do tributo nos contracheques desses trabalhadores, possibilitando um ganho real no orçamento no final do mês. Mas, a casa está contaminada pela ideologia política e pela pressão do bolsonarismo em aprovar pautas que interessam diretamente a eles, como a anistia e a blindagem. Nem o governo teve força pra avançar, nem Hugo Motta autoridade pra avançar. O Senado decidiu tomar as rédeas.
Pano de fundo
Nos bastidores desse movimento vem à tona uma velha rixa política e uma inimizade quase mortal entre dois expoentes: o senador Renan Calheiros (MDB-AL) e o deputado federal Arthur Lira (PP-AL). Pronto, o ringue está montado e, já no primeiro round, Calheiros saiu vitorioso. O senador alagoano tomou para si a relatoria do projeto de Braga, que estava parado no Senado e, como é terminativo, vai direto para apreciação da Câmara. Lira é o relator do projeto do governo, que deve ser votado somente na semana que vem na outra casa legislativa.
Oportunismo
O balde de água fria dado pelo Senado na aprovação do projeto do imposto de renda foi sentido na Câmara. Ontem à noite, Arthur Lira fez uma crítica no X e, sem citar nomes, afirmou que é “reprovável que alguns oportunistas queiram fazer politicagem com o projeto de isenção do imposto de renda”. O posicionamento se explica porque, inevitavelmente, ou a Câmara apensa a proposta do Senado, relatada por Calheiros, à matéria sob a relatoria de Lira ou vice-versa.
Xeque-mate
A demora da Câmara em avançar com a votação e aprovação da proposta pode configurar uma negativa à maior parte da população que aguarda, ansiosos, a aprovação deste projeto e deixar a casa numa situação mais delicada perante a opinião pública e, Hugo Mota, numa saia justa.
‘Não é só votar’
Sem citar Arthur Lira ou Hugo Motta, Renan fez várias críticas à relatoria do PL 1087/25 e a forma como a matéria vem sendo conduzida naquela casa legislativa. Segundo o senador, não é só a questão de votar, mas o que vão votar. Ele chama a atenção que, em seu texto, Lira tenta blindar a taxação super-ricos, que já está previsto na MP 1303/25. “Tenta blindar a remessa de lucros e dividendos ao exterior, blinda debêntures; o lucro das bets e retira da tributação os maiores salários”, observa.

